Por Pedro Popó
Jornalista
Estrela do Sul, uma pequena cidade localizada no Triângulo Mineiro, famosa por ter sido o chão onde foi descoberto um dos diamantes mais belos do Mundo, que empresta o nome à localidade; ter sido o lugar onde morou e morreu a lendária Dona Beija e por ser atualmente uma das poucas cidades que ainda preservam seu casario de estilo colonial remanescente dos séculos XVIII e XIX, também é lugar de gente que desperta a atenção pela sua inteligência rara, fenomenal.
Silas Lemos Vieira, 72 anos, é uma dessas pessoas. Conhecido como o “Homem Computador”, por fazer em segundos qualquer cálculo matemático e de cabeça, o estrelassulense tornou-se atração na cidade e é procurado por moradores para auxiliá-los a fazer contas. Ele é capaz, por exemplo, de calcular na hora quantos anos, quantos meses e quantos dias uma pessoa tem e sem cometer erros.
O ilustre morador de Estrela do Sul nasceu na roça, num lugarejo chamado Betel, no dia 9 de novembro de 1952. É filho do saudoso casal Ovídio Vaz Vieira e de dona Emília Isolina Vieira, estrelassulenses que labutavam dia a dia no campo para dar melhores condições de vida para os filhos. Estudou numa escola rural do lugar, que reunia numa só sala os alunos das quatro primeiras séries.
Quem foi seu mestre, segundo Silas conta, foi o saudoso professor João Mendes Vieira, primo dele, que certa vez ao aplicar-lhe uma prova de Matemática ficou surpreso ao ver que o menino franzino inteligente decorou a tabuada e tirou nota 10. Ao perceber que o aluno era capaz, o educador o incentivou a ir para a cidade e continuar os estudos. “Eu estava no terceiro ano e aí em vim e fiz até o quarto”.
O conterrâneo veio com a família para a cidade em 1968 e a nova professora ficou maravilhada. “Decorei todos os estados do Brasil sem saber a matéria”. Mas Geografia, no entanto, nunca era o seu forte. Silas gostava mesmo era de Matemática, porém, infelizmente, não pôde continuar os estudos. Ao terminar o antigo quarto ano primário, parou. Tinha que trabalhar para a ajudar a família.
Silas é extraordinário. As pessoas se extasiam quando o veem fazer as contas. Dá para perceber que ele cria um quadro negro imaginário no cérebro, escreve os números com os dedos no ar, que na sua memória viram gizes deslizando na lousa e quando erra o cálculo o apaga, passa o pé com força no chão do lugar onde se encontra e recomeça, como se estivesse dentro de uma sala de aula
O estrelassulense não sabe dizer quando surgiu esse dom de fazer contas, mas enfatiza que a aptidão ganhou força quando veio estudar no antigo grupo escolar. Gostaria de ter estudado mais, feito os cursos ginasial e o colegial, esse último equivalente ao atual segundo grau, mas reconhece que naquela época era difícil. Hoje, em razão da idade, não pensa em voltar aos estudos. “A idade veio, né”.
Não é só o dom de fazer contas “no ar” que Silas traz. Ele também decora, com facilidade, as placas dos carros que chegam a Estrela do Sul. Dos automóveis dos moradores da cidade, sabe de todos. Dos estranhos, quando algum chega, vê que é forasteiro. O repórter pergunta qual é a placa de seu veículo, adquirido há um mês. Ele fala na hora. Incrível. Silas o tinha avistado apenas uma vez.
Silas Lemos Vieira é aposentado. Na cidade trabalhou por 35 anos como gari na Prefeitura Municipal e era comum ele ser parado nas ruas, durante o seu batente, para ajudar alguém a fazer uma conta. Hoje quase não sai de casa e não tem nenhum hobby para se distrair. Quase não assiste à televisão e quando para diante dela vê só os jornais. Detalhe: não tem telefone celular. “Não gosto”, diz.
Nascido canhoto, ele usa os dedos dessa mão para fazer a contas no ar e não escolhe qual dos pés para apagar no chão os números imaginários. Vai qualquer um. O repórter o observa atentamente. Dá para ver que ele ousa escrever com a mão direita no quadro negro imaginário, mas logo volta para a de nascença. Quando está a calcular fica em silêncio, concentrado, matutando.
Silas não se casou. Mora com os irmãos numa casa na entrada da cidade e tem uma vida simples. Acorda às 6 horas, todos os dias e desde as primeiras horas cuida da moradia e do quintal. Fora a companhia diária dos irmãos, ele tem a dos “pets” que ficam de sentinela na porta, atentos a qualquer aproximação de estranhos. É tímido, de pouca fala. Aos domingos vai à igreja. É presbiteriano.
NR: Entrevista concedida no dia 06/12/2024.
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